28.11.11

epifania de uma noite

Aquele corpo tem o tamanho do mundo.

Aquele corpo cheira a mar e tem nos recantos sabor a sal de tanta onda que por ele passou. Aquele corpo deve demorar anos, meses a percorrer, da cor das cordilheiras e dos planaltos longos, com linhas direitas e geometria fluida, com braços longos e força para me encher. Aquele corpo é estranho, assustador. E tenta-me. É meigo e bruto num só aperto, e tanto corpo, de uma leveza só. Aquele corpo é terno, fugidio e entregue, exposto e misterioso, cheio de segredos e metros a discorrer. Tem voz densa e porte rouco, tem mãos, tem pés, tem cabeça. É estranho e assustador. E tenta-me.
Aquele corpo pensa, tem reserva, tem carinho, tem amor. E cheira-me livre, relaxado, entregue às mesmas vias que eu, e eu quero-me entregue ali, em cada mão eu toda, corrida, querida, tentada, encostada, uma e outra vez. A ir e voltar quando eu quiser, a ser marés. Aquele corpo é desejo e desconhecido, é espontâneo e contido e tão grande que só pode ter muito que se lhe diga.
E desejo-o generoso, amplo e aberto, desejo-o curioso, assim como estou de saber como ama de corpo, de abraço, livre, solto, um gigante a um pássaro.

23.11.11

Não alimento egos,


nem para isso quero servir. Sacio corpos e faço regadios de corações. 
A estrada que segui foi vermelho alma e quando a casa caiu a parada foi outra, as cores sempre lá estiveram e  a sépia só tenho as tristezas do que não vivi. No caminho, encontros e barrelas, acompanhantes, mas nunca de toda a viagem. Fui do c ao z com a analepse pedida. Um sem coragem, o outro sem cabeça e o primeiro sem coração. Sem saber ao certo, e em suspeita, se cada um é três ou se há três neles e nos outros tantos. As fadas, amigas, pouco madrinhas, e tão caminhantes quanto eu, só não disseram o que não saberia ouvir, ou talvez no meu caminho fui reencontrando a audição. As bruxas, os medos que espantei do coração. E a estrada, longa e sempre em mim. Descobri, andei, pulei cercas e nem sempre segui os tijolos propostos. O campo de papoilas é só uma, a mais formosa e acordou mundos, ventres, e uma ternura impensável e imensa, nos meus braços a adormecer de manso.
E as buscas de feiticeiro, a fraude da procura, porque tudo o que tenho está em mim, e quem não veio deve saber que o não se tem não se encontra.
Sempre fumos e espelhos para nos atemorizar, mulharas e castelos para quem quiser salvar, eu do lado de fora já, atalhos e tuneis para quem sabe o caminho com as mãos, para quem tem em si a salvação. Não brinco a esse jogo, não sou inalcansável, perdida sem ser por crer, crente num herói de... crente num herói que não eu. Não preciso, não desejo, não consinto. E cada vez mais vejo os tons entre o verde esperança e o ver de obsessão, espero que passe a birra do tempo. E sigo, viajante.
Há-de ser sempre assim, no fim que nunca o é, vermelho nos mesmos pés, os sapatos, a cada mil passos, diferentes.

22.11.11

Comprometi-me a voar outra vez... (com as cores do corpo que alguém me deu)





E para voos mais longos, abraço a dor. O capricho reconhecido, a patologia do dar marcada, o voluntarismo, o capitão que perde por só querer mandar, o desejo inacabado sempre na sofreguidão. Mas falta mais, falta a inércia, a rejeição, a mesquinhez ainda não encontrada, a fragilidade escondida nos braços fortes de uma mulher. Abraço a compulsão, os medos que engulo em seco por não querer reconhecer, os choros que não admito, a raiva que só danço, o orgulho escondido num sorriso amplo, as defesas por terra ao ver a primeira flor. Espelho-me, a preguiça, a languidez, a falta de disciplina, a mentira pequenina, o vicio da cama, a boca pronta, o ouvido manso. Toda a pequenez. Estendo os braços e aceito, aceito o que é preciso morrer.
Aceito a dor.
E respiro longo, a cada passo que vou dar, o primeiro em terra, o aço frio, a perfuração, um, dois, três, quatro. Preparo as asas, mais um passo em chão. Outro ainda. Agora, assim, o ar que vem, dentro de mim, em minha volta, suspensa, a tropegar no céu. Quero abrir os olhos, ver de novo o laranja e outras cores, mas deixar que cada lágrima me turve um pouco até chegar ao êxtase. Cada vez um pouco mais. Sempre no limite de mim, pelo menos assim. Puta, casta, frágil e forte, inteira, uma mulher e um rapaz, pausada no espaço, a saber dos braços dos outros, do caminho que tem que fazer, do inevitável e do que está nas mãos. A cumprir-me no firmamento.  A lançar-me, porque cada minuto é mais uma milha de corpo andado, porque cada folha é menos um papel branco para preencher, cada luta mais um cibo de amor.
A aceitar a alegria também, o riso fácil e franco, o desfrute por estar viva, a ternura concedida, os beijos, abraços e amassos, o espaço infinito na cabeça, tão grande quanto o universo do meu coração. As bênçãos todos os dias, os cheiros e suores, a liberdade de mãos, as pernas longas para correr, os dedos ágeis, a barriga cheia. A fé, os sonhos, os desejares de lábio na boca, as ocorrências, o outro, tudo em constante renascer.
Não sabia que um infinito também se desenhava num gancho, e que também se rasgavam as conquistas, quem diria... também são constantes...
O gesto repetido, de punhos, olhos abertos, pés atentos, abrir as mãos. O ser, o dar, o receber, em hélice dupla, numa evolução que é só um apuramento.



Mania de viver.

18.11.11

um poema que escreveram para mim (e tão lindo):

Carmo e a trindade

Palavra fácil, disparada ao alvo;
à outra palavra, pueril heresia.
Do alto da sua convicta idade
— ainda curta, mas já maturada —
afirma, segura, os juízos correctos.

Traz sempre o vocábulo afoito
para a estóica peleja ideal, plena
de correcta rebeldia, sem medo
dos cacos das convicções alheias;
quebradiças — de fraca arte.

Sem grilheta que a contenha
respira por um sorriso franco,
daqueles que não esconde
limão, laranja, ou manga
— por mais que queira.

Gonçalo Taipa Teixeira

17.11.11

Mato o gato?

O meu coração é uma máquina de produzir sinais, é uma fogueira e um cobertor no cimo de um planalto, é uma autoestrada riscada de verdes e azuis, uma praça cosmos de luzes rosamarelocrazulemuitovermelho, um playmobil no cruzamento, um agiota com placares, um distribuidor de publicidade, o rapaz que entrega o jornal no metro, um pregador no jardim. O meu coração não cansa, urge, ruge, chama por ti. O meu coração não pára, segue, descobre, encontra rastos por mim. Vive de ar e do pouco que sabe, dança para te ver, e cada presença (nunca vista) treme, foge e golfa muito ar. É um comboio a vapor num traçado circular, uma fornalha de carvão que se finge alimentar. E acredita no que sente, e sente com pouca pista, sente muito e está bendito: mesmo partido, respira.
Tenho um músculo triste, com pulsão para esperançar.
Rijo, tremendo, em riste, ainda com vontade de te amar. Crente na dúvida, no volta a trás, no jogo virado e na satisfação. Pronto para o triatlo, para o salto em vara, para a tua dificuldade em largar. Um campo aberto, sem engodo, mas com tanto ainda para te mostrar. Uma savana, quente, batida, caçada.
O meu coração é uma montanha, larga, ampla e de segredos, todos o mesmo. Água e vida... tempo e muito para explicar.

E se isto é curiosidade... deixa de me visitar.

12.11.11

às vezes os arcanjos visitam em noites inesperadas

Foi bom rever-te. Relembrei utopias, voltei-me a sentir no meio dos meus desajustados, os excluídos, as minhas margens boas. Os imperfeitos tão perfeitos quanto eu.
Reencontrei esses desejos, as forças para o coração aberto.
Sei que ainda me dói, um bocadinho, sei que ainda vai doer. Sei também que vi o oito e os limites de um amor. Mas fiquei um pouco mais perto da cura.
E dizem que as dores servem para aprender. Hoje, de novo, trouxeste-me amor e a visão de estar mais perto do núcleo, cada dia mais perto de mim mesma, embora às vezes um pouco desencontrada,e esse sorriso que vem de dentro... lembrou-me... sexo é cura... abraço é cura... amor é cura... Porque viemos todos feridos, quebrados para aqui. Porque nenhum de nós chegou completo e isso é o que nos torna grandes. E um beijo na face pode iniciar um turbilhão e devolver corrente a um mundo inteiro.

Espalhem as brasas, percam as palavras, somos uns quantos e viemos para... curar!

10.11.11

again a safe space (please)

Para quando é que este coração se vai convencer que o que foi, volta não tem? Abrigar a tristeza que abraça e devagarinho aceitar que mais que a terra em pousio, será coutada fértil de novas caçadas. Quando acorda a Diana e as passadas largas, a alegria dos bosques e as clareiras quentes?
Para quando as asas soltas, a anca a jeito e o riso fácil? O desprender de um sonho que constantemente assalta num tom tão triste... o abrir a mão da esperança e das manhas do silêncio.
Onde anda a fineza ágil, a astúcia livre, a vontade do tudo sem nada, sem um nada a perder.
Onde anda o prazer?

4.11.11

.

acordar velhos prontuário, enquanto adormeço significados que já não me pertencem

peito adil, bem alfado, depois de alanzoado, calhava bem com todo o alvará de soltura

eira boa, nem códeo, nem latifundio sempre em uso

fui eu quem deixei que me trouxessem às carrachinhas, que demorei a ser mulher

por pouco sentindo-se um balau

continuo esbategada, mas porto-o com orgulho e mais perto da minha mão

bôlas feitas pela minha avó

arquetipo de fada
apanhada depois do ímpado
se disse certo ou se imboleia




quando o for será um branil

chega de ser cacarel

ála daqui

bodeguice

quando terminar a missão, de carrela no braço

chasca e ch/xaroubelo

decruar a cabeça

controlar entôlhos