28.1.12

um dos privilégios de ser livre

De corpo aberto e boca molhada, a encontrar outros sagrados, em beijo espontâneo ao que a vida nos dá. E pelo meio a bênção de príncipes em crescimento, perdidos num encontro que não se sabe bem quando será, e um trilho de corações a preparar a chegada. Menti, na caixa não estava uma ovelha, estava um pouco do meu coração... tão solto quanto os braços arremessando meio mundo e mundo e meio, tão completo quanto a pele que sente todas as mãos numa só, tão tonto quanto um coração externalizado num peito, tão aceite quanto a busca da montada, certa e dura, enquanto rio do já expectável.
Para um dia me seguires... para um dia também me enlaçares.

Porque o amor também espreita numa rua e se escreve em canos e painéis, usa preto, vermelho e azul e deixa rasto nas mãos e na pedra.

26.1.12

o sagrado coração (revelado e fugido)

Cada passo tem a sua cura, cada tempo o seu choro e hoje de faca espetada no sagrado, a fuga. 
Estranho reconhecer este caminho e a forma como com cada lágrima vieste tu e o outro, ambos pela ausência, pela distância, o meu alfabeto de mágoa. E vê-la a subir de repente, a secar o rosto com um beijo, a subir de tom, tomar em cima tudo o que me pertence. A loba, tremenda, assustadora, a loba que tudo quer e tudo joga, sem ficar com nada de ninguém, que trepa para cima e faz do corpo mais forte tripas sem coração, gula e comida, no mesmo gesto que com a mão o cala e o deita ao chão. E é essa a protecção, a batalha, o rugido, do ventre quando às portas do tal sagrado coração. Percebo porquê o lugar, que bem mapeado ficou no corpo, a boca fala estômago, dele o punho e a mão. E deixa os dentes profanar, o corpo solto, rejeitar o braço, a ternura e a perca. Esses só na mão, na língua, no cheiro, no riso rosnado, nada de sagrado, nem coração. E deixá-lo menino, reconhecido, assustado o varão, com medo pequenino, confessado ao coração, ir buscar o ouvido, parar o jogo porque as regras foram explicadas e se fechou o portão. Tudo no momento, depois o nada e o nunca mais. Tudo, o absoluto, incompleto o corpo, desterrado o coração.
A conclusão foi uma, em braços de homem não chora o coração. 

Ainda não.

25.1.12

coração seringueiro

Até a mim me espanta a certeza com que digo parta-se o meu antes dos outros, com que abandono ao caminho tudo o que sei que é devido e tranquila vejo as veredas cada vez mais altas e os sonhos trôpegos. Pareço saber que tudo o resto é de vidro e que eu, a tudo entregue, tudo resisto. Espantam-me os delírios, as febres poucas e este sol de inverno estéril, sabendo uma primavera breve, fora de estação, a crescer neste pousio, terra mole, revolta que é o meu coração. E sei que espero com a certeza de não acontecer para breve, de ser tenra e doce como um fruto de verão, de passar novembro, todas as metas e promessas ou não. E num passo, um chiado fininho, o medo do espaço medido e do encontro que traia tudo em mim de tão bonito. Ainda temo ver o passado de tão estranho que se me tornou, tremo, tonta, entregue, o buraco, o falhado, a prova do que não sou.
É um tempo sem vento este, que me faz querer chuva e emoção, que me põe entre a comida e o prazer, dando-me um pouco de tudo, mas nunca o suficiente para satisfazer. Um tédio disciplinar, no meio do acordar, sorrir e deitar. E abandonada às muitas aventuras, sempre presente este espaço coberto, coração, braços, peito balofo, onde os outros balançam sem risco porque deixo todo o dia que o risco seja só meu. Não me assusta, nem faz temer, a tempestade do meu sangue precisa de muito mais para ser.
E de borracha, grande ou marinheiro, é meu, completo e velejador. Em ordem vaga ou caos horário, calmo, displicente, ensinado, sem autoridade, nem lei, nem mar revolto a navegar.

19.1.12

não (porque também assim é)

Depois há estes dias... dias em que me sinto cansada, rota, espremida, dias em que se abro as mãos é por rendida, numa desistência tão só passiva. Dias em que o corpo range, seco, e os espelho grita. em que o ventre carente clama por outro, o de ontem, o de amanhã, o que não veio, nem se quer e o corpo fica mal vestido, em que nada lhe serve, e pouco a própria carne. Transvestido numa dor de saudade, de ausência. Onde a nostalgia tem lugar, as dúvidas crescem e se deseja ou o que já não lhe cabe bem ou o que não teve, nem esquece. Dias perdidos, sem vento, só tédio, onde tudo é feito, mas nada cumprido com um sorriso. Dias lugares, praças de pedra e sombra, dias vaguear sem sair do sítio. Depois... há esses dias, que fazem três mas já não se justificam, que levam a alma para o que passou e escondem o coração. Dias de pele grossa mas pedinte, de mantos sem promessas e de quartos que se querem vazios, dias em que não, nada, sem crença, nem perdão, nem se sabe quando passa e quanto se tem que passar. Dias de só em audiência, de próprio julgamento e de juiz compaixão tremida, sem lágrimas, sem sentimentos. Dias em que nada passa e tudo é devagar, em que sou só assistência. Dias em que não há no que acreditar.
Depois há esses dias... cansada. Quieta pelo dia seguinte. Com mãos mornas e pêlo frio, revestida a reptil e perdida pelo não conseguido, pelo direito que ainda não foi oferecido. Dias mágoa, disfarçada, calada, de uma só lágrima pelo canto caída, no lado de quem não vê.
Dias quieta... há espera do outro dia.

12.1.12

Ainda bem que ninguém me ensinou a desamar

Primeiro quis-te fervorosamente em mim, conservar todo o amor, mesmo suspeitando impossível que seria ter-te sem premissa, sem colaboração. Houve momentos em que espalhava aos ventos esse amor tão aplacável, tão brando e grande como o mundo todo quereria. Momentos em que me julgava maior. Houve dias em que me deixei pequenina, à espera da tua resposta perdão que não vinha. Outros em que chorei por te sentir a fugir do meu coração, por pensar que era rejeição birra por não teres tudo o que querias e não ver que era tudo... maior. Ouve... fui crítica, vi todos os defeitos, podres e horrores por não me quereres falar. Olhei para o feio e a dizer que o fazia, não estava a saber perdoar. E por não ver mal que te fiz, empederni, tornei-me imperdoável, arrogante sem dar conta. Já não digo que não te fiz mal, nem procuro essa raiz a rever os passos atenta a tudo o que fiz. TU o hás-de saber, e quererás dizer-mo ou não, e hei-de-te ouvir, rir e sofrer, ou talvez nunca se fale mais, com tantos atalhos diferentes, com os baraços e desembaraços que diferentes vidas dão. Continuo a ter pena de te ter feito sofrer, mas não tenho culpas e o tempo passa sem as saber, ou querer. São formas tão diferentes e as conversas têm os seus tempos.
Toda a tua recusa e rejeição parou de doer e nesses tempos pensei que tinhas saído do meu coração, não sei se fugido tu ou expulso por mim, descido para as entranhas, pronto a uma ultima transformação, e em rima de criança, de escárnio suave no meio de um riso tremendo, todo tu, completo, saído, sem esforço, bem digerido, fora de mim.  
Depois sonhei-te, e o sonho não foste só tu, mas foste um momento. E vi-te numa casa grande, no meio de tantos nossos amigos, sentadinho no chão, com uma ela que não sei quem é perto de ti (houve tempos em que também suspeitei que isso iria doer, se me anegrar sei que é ego, infantil, por um sentimento de posse e orgulho ferido que nem me pertence nem é de mim). Ajoelhei-me perto de vocês, a conversa era boa, leve casual, permeada de risos baixinhos e delicadezas (relembro como isso é tão teu e tão bom, agora depois de o sonhar). Nada pesado e os limites que sentia também não incomodavam, a intimidade era outra, cúmplice mas distante, indicando que nada havia sido conversado (e descanso agora, o tempo dirá se é necessária ou não). E depois vem o bonito, olho para o pavimento de madeira clara enquanto converso e vejo. E vejo, os pés emeiados, o teu, o dela, e uma festinha meio entrelaçado tão lindo quanto prometedor. Não digo nada, e por dentro sorrio, sorrio muito. Um sorriso, este sim MAIOR. 
Foste o meu primeiro grande amor. E eu fui um teu, grande e bonito também. Espero que encontres outro e que o honres, com um tamanho assim MAIOR. Sei agora com certeza que só te quero o Bem. Sem mais nada determinar.
E o tempo há-de fazer com que haja bons encontros... ou não. Já não é importante, e quando foi estava enganada, porque o importante é o sentir.
Ambos mereceremos e saberemos ser felizes, 

c.

8.1.12

o passeio imperativo

Em que canto da prateleira arrumo a lasca de coração que sumiu, sem saber se foi ego ou paixão? Como simbolizo, manifesto, em que objecto, o beijo que afinal não aconteceu? A rua em tarde alta, o pedido tolo e encantador, o espanto e o medo com todo o meu dispor... 
Os patetinhas conquistam sempre um sorriso promissor. E um encosto... que delícia, que prometia bem a jeito uma rebolada e algum terror. Diz-me que comigo fica um cão... diz-me que ...ai...contigo... que impressão... tenho que fazer boa figura. Explico...não sou mestre, nem professor. A vontade fica. Fica também a forma como me chamou bonita. 
Encantador...
Como se pune um crime de amnésia... e depois do torpor, quem tem culpa, o ofendido ou o ofensor?