7.5.13

As vestes rasgadas de Ariadne

Uma súcubo também sente e a parte touro também sonha. 
Recorto no corpo os beijos que um me deu, a pegada com que o outro me puxou, a laranja descascada com que um dia amanheceu. Reconhecem-se as carências, os gestos pequenos que criam frágeis pontes por cima das estradas. Arrumam-se os amantes, a cada seu lugar, sem saber onde se expira a constante tesão, com dúvida, cada dia com mais resposta, se se quer perder o coração ou o tempo que resta para tudo se resolver. A consciência do risco e do que falta onde. E um corpo com um tempo de vazão cada dia mais contado. Sem deixar confundir o outro com masturbação. A cada ser a sua honra, mas dias e gente há com menos preceito. A falta de paciência para fazer número e indecência de não resistir. Mas é um corpo tão grande a querer tantas mãos. Ou mãos que não saiam, com o desejo tão grande como o mundo é desejado por ela. Segura-se a boca, trava-se a língua no corpo a saber que a partilha com muitos não é, tantas vezes, a partilha de ninguém. E a cabeça, antes nunca preterida, o corpo, que agora alimenta e alumia, o coração que dia a dia se fecha. Ou passa de portões  grandes a labirinto. Como se finalmente fosse hora de apenas uns poucos chegarem ao centro e se soubesse cada vez mais aguardar os novelos, derrotando o monstro e desposando a beleza. E tudo um trabalho tão seu, numa mitologia criada e largada de quatro, enquanto a cada encontro vem pelo menos um gozo e um suspiro. De um os pelos e o cheiro, de outro a forma como foi fodida. Sinais entrelaçados em listas de dores e prazeres, como se cada encontro tivesse senhas para acordar a besta ou a rainha, mas ainda nenhum a mulher e a menina. Como se pode completar aquilo que não se vê, não vive completo? Como se cumpre um coração sem se cumprir a cabeça? E que se espera de um corpo sem função? Espera. E cada dia se constrói e destrói uma obra de Creta, se desleixam ou preparam os portos, onde podem chegar veleiros, mas de onde mais cedo têm que sair navios. 
Uma primavera que tarda de tanto se semear devagarinho, a pergunta se agora se aprendeu com um e por hora se será este coração que ficou frio ou se só tudo nascerá quando se arar a cabeça tirando a pedra que não serve, usando-a para o lugar dos perdidos. Nos momentos em que nada importa e tudo se concretiza. Cumprindo funções para depois poder dar os fios do vestido. Sabendo que tudo será apenas no dia em que tiver as velas brancas para os navios.